O Centro de Estudos de Reparação e Recuperação (FGV C2R) da FGV Projetos é o resultado de sua experiência em projetos de assessoria técnica em desastres no Brasil. Seu objetivo é articular o conhecimento prático da FGV Projetos com o conhecimento acadêmico produzido nas escolas da FGV para aprimorar a compreensão dos processos de reparação e recuperação após a ocorrência de desastres ambientais ou tecnológicos. Com uma abordagem interdisciplinar focada na intensa aproximação entre teoria e empiria, baseada em métodos quali e quantitativos, o FGV C2R é composto por pesquisadores com ampla experiência profissional e acadêmica nos temas pesquisados.


A categoria desastre é polissêmica e, quando ocorre, quer em decorrência de um fenômeno natural quer tecnológico, diferentes significados são atribuídos ao evento, sendo objeto de conflitos ou levando a processos de cooperação. Surgem então diferentes formas de representar o mundo social, atuando agentes públicos e privados, instituições e indivíduos. O processo emerge em meio a um campo de forças, em que estão presentes múltiplas racionalidades, conformando tensões e disputas nas lutas pelas classificações em torno das melhores formas de reparar e recuperar territórios, formas de vida e existência, após os desastres.
O processo de reparação destina-se a compensar os danos causados. O que pode incluir ressarcimento financeiro às vítimas, reconstrução de infraestruturas danificadas e restauração de serviços essenciais, além da reparação por perdas imateriais, coletivas ou individuais. Tem por finalidade mitigar os impactos imediatos e diretos, proporcionando alívio e suporte às comunidades afetadas. A recuperação, a seu turno, refere-se ao processo de restabelecimento das condições normais de vida após um desastre, priorizando a reabilitação dos serviços e ecossistemas e a sua continuidade, incluindo a capacidade das comunidades de absorver o impacto de desastres posteriores. Tem por objetivo restabelecer tornar as condições de vida iguais ou melhores que antes do desastre. Assim, se a primeira se refere ao processo de compensação dos danos causados, a segunda busca não apenas restaurar o que foi perdido, mas também fortalecer a capacidade das comunidades de lidar com eventuais futuros adversos, preparando o espaço e meio ambiente.
A criação do FGV C2R no âmbito da FGV Projetos justifica-se em razão da experiência acumulada internamente em processos de reparação e recuperação socioambiental após desastres.
A instituição atuou em diferentes projetos relacionados ao tema ao longo dos últimos anos:
Em 25 de janeiro de 2019, aconteceu a rutptura da Barragem do Córrego do Feijão em Brumadinho/MG, o que ficou conhecido como o mais grave desastre ambiental ocorrido no Brasil. Além das consequencias ambientais, levou a morte de 272 pessoas e causou diversos danos que se alastraram ao longo da bacia do Rio Paraopeba. Os danos econômicos e sociais também foram de alta gravidade, com perdas substanciais para as comunidades locais.
Em 4 de fevereiro de 2021, um acordo judicial estabeleceu diversas medidas de reparação. Entre elas, o Programa de Transferência de Renda (PTR), para o qual foram destinados R$ 4,4 bilhões, e cuja duração prevista era de quatro anos. O PTR, que atende Brumadinho e mais 25 cidades do Vale do Rio Paraopeba, até a Represa de Três Marias, é o maior programa de transferência de renda privado da América Latina.
Para gerenciar o PTR, as Instituições de Justiça escolheram a Fundação Getulio Vargas (FGV). Até janeiro de 2025, já foram pagos mais de R$ 3,6 bilhões a cerca de 155 mil pessoas atingidas pela tragédia. “A reparação não é só feita com obras de recuperação ambiental e de espaço público, mas também com o pagamento às pessoas. É esse modelo que chega aos mais pobres. É inegável o efeito desta distribuição de recursos na economia local”, explica André Andrade, gerente executivo da FGV Projetos.
Uma pesquisa realizada pela FGV Ebape em 2024 (Socio-Economic Impact of the Brumadinho Landslide: A Hybrid MCDM-ML Approach) investigou o desenvolvimento socioeconômico de municípios após a tragédia do rompimento da barragem da Mina do Córrego do Feijão. O trabalho utilizou modelos híbridos de tomada de decisão e machine learning para avaliar a eficiência do PTR e concluiu que esse recurso teve impacto positivo no desenvolvimento da região. Entre os indicadores que mostram o impacto socioambiental positivo estão a melhoria de 20% em saúde, 15% em infraestrutura (urbanização e saneamento) e 25% em assistência social na região após a tragédia, impulsionando o desenvolvimento sustentável e o bem-estar das comunidades afetadas.
A pesquisa analisou a eficácia do auxílio financeiro em promover a recuperação sustentável e a resiliência nas comunidades afetadas ao longo de 14 anos (10 anos antes e 4 anos após a tragédia). Os impactos do PTR têm implicações importantes para os decisores políticos: “O estudo demonstra que modelo de transferência de renda, consagrado na Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) é uma política pública necessária aos processos de reparação”, avalia.
Desde que foi implantado, em novembro de 2021, o PTR Brumadinho tem sido pago a 154.964 pessoas. Ao longo do trabalho já foram desembolsados 3,65 bilhões em pagamentos aos atingidos. Houve a abertura de Postos de Atendimento Fixo em pontos estratégicos do território, em cada uma das cinco regiões compreendidas no programa. No total, mais de 131 mil pessoas foram cadastradas, resultando na inclusão de 58 mil beneficiário no programa após a análise dos requerimentos apresentados.
O Projeto Recomeço foi fruto de uma parceria entre a FGV Projetos e o Instituto Verdescola, uma organização sem fins lucrativos com atuação no Litoral Norte de São Paulo, que tem como objetivo fornecer atendimento psicossocial, educar e formar mais de 700 crianças e adolescentes das comunidades locais, além de oferecer cursos de qualificação profissional e ensino técnico para jovens e adultos e promover parcerias para inclusão e redução da desigualdade social. O Projeto foi concebido para assegurar a mais correta e justa distribuição dos recursos recebidos pelo Instituto em decorrência da tragédia ocorrida em 19 de fevereiro de 2023, que afetou as famílias moradoras das comunidades de Vila do Sahy e Baleia Verde, em São Sebastião, cujas casas foram atingidas por deslizamentos de terra.
Sensibilizada pela relevância social e diante da vulnerabilidade da população atingida, a FGV se dispôs a executar a pesquisa socioeconômica em caráter pro bono, de forma a colaborar com a retomada da qualidade de vida das fa-mílias afetadas pela tragédia. Com base na sua experiência em apoiar pro-cessos de reparação de danos em comunidades, a FGV Projetos realizou o mapeamento das pessoas atingidas para entender suas necessidades e as perdas sofridas. Além disso, apoiou na definição dos valores a serem desti-nados às famílias elegíveis e nos processos de distribuição de recursos às famílias.
O processo de acolhimento das famílias participantes do Projeto Recomeço foi conduzido em coordenação com as autoridades estaduais e municipais atuantes em São Sebastião, bem como associações locais de moradores. Isto permitiu que as atividades de campo conduzidas pela equipe da FGV fossem executadas com base no princípio do tratamento humanizado das pessoas atingidas, com compreensão das vulnerabilidades e das necessidades dos núcleos familiares.
O Projeto Recomeço teve importantes resultados junto às comunidades de Vila Sahy e Baleia Verde, com a distribuição de quase mil cartões pré-pagos com cerca de 9 milhões de reais para atender às famílias da região, que puderam utilizar os recursos para recompor seus lares e recomeçar suas vidas de forma digna.
Em fevereiro de 2019, os moradores dos distritos de Socorro, Tabuleiro, Piteiras e Vila do Gongo, em Barão de Cocais, tiveram de deixar suas casas em função do risco de rompimento da barragem Sul Superior da Mina de Gongo Soco. O Plano de Ação de Emergência de Barragens de Mineração (PAEBM) foi acionado e a estrutura, que acumula 4,8 milhões de m3 de rejeitos de minério, foi elevada ao nível 3 de emergência, o que segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM) significa que o rompimento é inevitável ou já está acontecendo. Outras áreas de Barão de Cocais, além da Zona de Autossalvamento (ZAS) e da Zona de Salvamento Secundário (ZSS), também foram inseridas na chamada “mancha de inundação”, desde comunidades rurais até as ruas do Centro Histórico, demarcadas com pinturas no meio-fio e placas com instruções para a evacuação.
Em agosto de 2023 foi assinado um acordo pela mineradora junto ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais, a Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais, o Ministério Público Federal, a Diocese de Mariana e o município de Barão de Cocais, pelo qual a Vale se compromete a executar Plano de Reparação e Compensação Integral, dividido em seis programas: Plano de Compensação e Desenvolvimento de Barão de Cocais; Transferência de Renda; Turismo e Cultura; Segurança; Fortalecimento do Serviço Público Municipal e Projetos de Demandas das Comunidades Atingidas.
Para gerenciar o Programa de Transferência de Renda (PTR), as Instituições de Justiça escolheram a Fundação Getulio Vargas (FGV). Para realizar o cadastramento e pagamento das pessoas diretamente afetadas, a FGV contou com uma equipe técnica sensível às especificidades de cada comunidade, considerando as condições socioeconômicas, culturais, étnicas e de vulnerabilidade social dos moradores que têm direito a receber reparação.
Desde que foi implantado, em 06 de maio de 2023, o PTR Cocais foi pago a 9.543 pessoas cadastradas pelas equipes da FGV. Um Posto de Atendimento Fixo foi inaugurado no centro da cidade e equipes volantes percorreram a Zona Rural e as comunidades mais afastadas, com agenda mensal de atendimento. No total, foram realizadas mais de 17 mil consultas, incluindo cadastros, solicitação de informações, correções de dados pessoais e alteração de dados bancários.
Linhas de Pesquisa:
Seguindo a tradição da FGV de ser uma instituição inovadora com a missão estimular o desenvolvimento socioeconômico do Brasil, como centro de excelência na produção e aplicação de conhecimento, os estudos do FGV C2R terão como pano de fundo a constante aproximação entre o conhecimento acadêmico e a prática no campo da reparação e da recuperação socioambiental, numa perspectiva interdisciplinar. Nesse sentido, produzirão conhecimento relevante e aplicado a partir de estudos empíricos que privilegiem dados originados desde pesquisas de campo ou trabalhos de assessoria técnica no setor, baseados em rigor teórico e metodológico, focando nas instituições e nos indivíduos.
Os temas da reparação e da recuperação socioambiental contemplam uma gama de subtemas, que incluem a preocupação com meio ambiente, o desenvolvimento econômico, a gestão de stakeholders, o atendimento à população atingida, o monitoramento e avaliação, o planejamento, dentre outros. O FGV C2R terá, portanto, duas linhas de pesquisa, divididas de acordo com as perspectivas institucional e social:
Governança e Cooperação Institucional – englobará os estudos voltados a compreensão da relação institucionais envolvidas nos processos de reparação e recuperação tais como empresas, governos, órgãos reguladores, órgãos do sistema de justiça, sociedade civil organizada, entre outros. Dialogará com as pesquisas institucionais, de gestão, de processo e as teorias daí derivadas.
Pessoas e População Atingida - incorporará os estudos voltados a compreensão dos efeitos dos processos de reparação e recuperação sobre a população atingida ou vulnerável e os agentes envolvidos neste processo. Dialogará, para tanto, com as pesquisas sociais e econômicas e as teorias daí derivadas.
Irineu Frare
Coordenador
PhD em Estratégia e Desenvolvimento Empresarial, mestre em Administração Pública e bacharel em Ciências Políticas. Foi consultor em organizações não governamentais, coordenando há mais de 10 anos projetos de Desenvolvimento Institucional com foco em Planejamento Estratégico, Reestruturação Organizacional e Análise de Políticas Públicas. Coordenou o MBA Executivo em Gestão Pública da FGV Online durante 10 anos. É Diretor de Estratégia e Mercado da FGV Projetos.
André Andrade
Coordenador Adjunto
Doutor em Administração pela EBAPE/FGV (2013). Doutorando em Direito pela FGV Direito SP. Doutorando em Direito Constitucional pelo IDP. Mestre em Filosofia pela UGF (2004). Especialista em Análise de Sistemas pela UERJ (1997), E-Business pela FGV (2001) e Propriedade Intelectual pela Unisa (2005). Graduado em Economia pela UFRJ (1995) e em Direito pela UERJ (1996). Gerente de Projetos (PMP) com ampla experiência profissional no setor público. É Gerente Executivo na FGV Projetos.
Aline Brêtas de Menezes
Pesquisadora
Doutora em Administração pela EBAPE/FGV (2022) e Mestre em Administração Pública pela EBAPE/FGV (2014). Foi Coordenadora do Mestrado Profissional em Administração Pública da EBAPE/FGV. Atuou no serviço público federal como Oficial Intendente da Força Aérea Brasileira. É editora-chefe da Revista Tecnológica de Administração (FGV RETA).
Izabel Nuñez
Pesquisadora
Doutora em Antropologia pelo PPGA/UFF (2018). Doutoranda em Direito pelo PPGD/UERJ. Mestre em Ciências Jurídicas e Sociais pelo PPGSD/UFF (2012). Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS (2007). Especialista em Gerenciamento de Projetos pela FGV. É pesquisadora do Instituto Nacional de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos (INCT-InEAC), da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro e do Núcleo de Pesquisas em Direito e Ciências Sociais (DECISO/UERJ). É coordenadora de Projetos na FGV Projetos.
Joelson Sampaio
Pesquisador
Doutor em Teoria Econômica pela FEAC/USP (2015). Doutor em Finanças Corporativas e Mercados Financeiros pela FGV (2015). Foi diretor da Sociedade Brasileira de Finanças (SBFIN). É bolsista produtividade do CNPQ. É pesquisador permanente do Centro de Estudos Quantitativos em Economia e Finanças da FGV EESP e do Núcleo de Pesquisa em Economia Financeira (NEFIN-USP). É professor da EESP/FGV e da FEAC/USP.
Luiz Lourenço de Mello Filho
Pesquisador
Doutor em Ciência da Informação pela UNB (2023). Mestre em Economia Empresarial pela UCAM (2010). Bacharel em Informática pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro pela UERJ (1987). Atualmente é pesquisador vinculado ao grupo de pesquisa em Estudos de Representação e Organização da Informação e do Conhecimento (CNPq/UNB). É professor dos cursos de pós-graduação (MBA) da FGV, da Universidade Federal Fluminense (UFF), do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC) e da Escola Nacional da Magistratura (ENM) ministrando as disciplinas de Transformação Digital, Business Analytics, Gestão de Projetos e Automação de Processos. É autor de softwares especialistas na área de Gestão Documental e da Informação e atua como Consultor de Tecnologia da Informação, Inteligência Artificial, Sistemas de Gestão Estratégica e de automação de Processos pela FGV Projetos em diversas Organizações.
Pierre Oberson de Souza
Pesquisador
Doutor em Administração de Empresas pela FGV/EAESP (2021). Mestre em Administração de Empresas pela UFRGS (2015). Engenheiro mecânico pela UFRGS (2012), com foco em finanças. É Professor na FGV/EAESP e consultor estratégico na FGV Projetos. Atua no campo de avaliação e reestruturação de empresas, análise de viabilidade econômico-financeira de projetos, estudos de impacto e mecanismos de governança corporativa.